terça-feira, 3 de julho de 2007

NÃO HÁ TARDES DE AGOSTO COMO AQUELA! (parte 2)

Não há tardes de Agosto como aquela.
Não que estivesse a chover ou o frio nos provocasse, fora de tempo. O sol estava lá em cima. Bem ao alto. Olha-se. Dói.
Se fosse um nevão repentino também não me perturbaria. A mim não. Nem aos miúdos do rectângulo ali ao lado. Trocariam a areia pela neve nas suas pás e nos seus baldes de praia. Haviam ainda de trocar os frágeis castelos de areia pelos brilhantes bonecos de neve. E ficava-se por aí!
E se estivesse trovoada, acharia isso algo de invulgar? Também não. Iria de certo entreter-me a contar os relâmpagos e a multiplicá-los pelos segundos de silêncio até chegarem os trovões.
Mas uma coisa posso garantir. Não há tardes de Agosto como aquela.
Eram duas horas da tarde. Talvez mais. O relógio da cozinha andava sempre desregulado. Se se atrasava, eu adiantava-o. Se se adiantava, eu, logo que me apercebia, atrasava-o. Era uma luta incessante. Eu não ganhava é certo. Porém ele também nunca se distanciava muito. Ás vezes, baralhava-me. Mas não por aí além. Nesse momento. Os seus ponteiros talvez marcassem duas horas.

Era uma tarde de Agosto. O dia não sei bem. Desta vez, a culpa não é do relógio. É minha. Não gosto de datas. As datas são contadores complexos que não se podem controlar. Acontecem sempre, em qualquer condição. São meras transcrições do tempo. E para isso, bastam-me as horas do meu desorientado relógio.
E se sei que era Agosto deve-se à fruta em exagerada abundância. Para quê tanta fruta? Perguntava. Para quê ter que por o planeta a cheirar a um imenso laranjal? Nunca ninguém me respondia, porque ninguém questionava isso. Mas eram tantas as árvores, que se perdiam de vista, no meu rectângulo, deste lado de cá.

Quase que me perco na narração.
Era uma tarde de Agosto.
Única.
Estava sentado numa cadeira da cozinha. Acabava de ter almoçado. Talvez tivesse cozido bacalhau. Juntava um pouco de grão. E o resultado era sempre bacalhau com grão. Acho que era assim todos os dias!
Tinha certamente música a tocar na cozinha. Gostava de comer ao som de qualquer coisa. Fosse a sinfónica de Londres. Fosse o piano de Michael Nyman. Fosse o que fosse, almoçar com música era reconfortante... Aprendi num filme. As pessoas tinham classe.
Não me vou perder! Fica para outra altura.

1 comentário:

Anónimo disse...

Delicioso....a incerteza, a despreocupação...para quê a descrição..era uma tarde de Agosto...vem...verão, esperamos por ti.

Cat